Caio – Entrevista

1 – Olá Caio, aka João Santos. Faz de conta que estás no Alta Definição, onde o Daniel
Oliveira está ausente, mas onde a filosofia da entrevista é semelhante. Não te vou perguntar,
no fim, o que dizem os teus olhos, fica descansado. Dito isto, o teu primeiro EP, o
“Desassossego”, teve que influências? Existe alguma relação entre a obra do Fernando Pessoa ou foi mera coincidência? E claro, fala-nos de como e quando te decidiste aventurar no mundo da música.


R: Olá, antes de mais é um gosto estar aqui neste falso Alta Definição (Risos). Realmente, no
meu primeiro EP há uma influência literária de poesia e alguma prosa de vários quadrantes
que andava a consumir na altura em que o concebi. Autores de Adília Lopes a Mário
Zambujal, por consequência, por vezes também havia Fernando Pessoa ao barulho mas não
posso considerar influência-una, gosto de boas misturas e faço por elas.


2 – O “Viagem”, surgiu em 2017 e com ele ficamos a par da tua capacidade em construir um
álbum mais complexo e robusto na sua extensão. O que é que te levou e motivou a
desenvolver este trabalho? Foi a vontade incessante em sairmos do lugar e de sermos turistas?
Ps: Quem quiser viajar, pode fazê-lo sem sair do lugar ao ouvir este álbum. É bom de ser
visitado, um postal sonoro.


R: Sim, isso mesmo! Parece-me essencial extravasar e ir almejando por planos artisticos que
alarguem o projeto, acho que acaba até por ser inevitável quando vamos conhecendo
fazendo amigos artistas e penetrando no meio. Acontece de forma muito natural, é uma
viagem muito saudável para mim, recomenda-se.


3 – Em 2018, a BLITZ considerou o “Mundo Incerto”, como um dos melhores álbuns do ano.
Colocaste muita “responsabilidade” neste álbum, pois querias que ele te possibilitasse
construir um futuro na música, num mundo que fosse certo. Cumpriste a tua expectativa? Que impacto e importância teve este reconhecimento para ti?


R: Bem, pergunta di_cil… Acho que um álbum não deve carregar propriamente uma
“responsabilidade”. A criação pode fluir sem pressões. Fico contente com o feedback e a
quanto mais pessoas for chegando é sempre um ganho. É um papel muito especial e
interessante dos meios de comunicação quando vão estando atentos aos ar\stas
emergentes.


4 – Em 2019, o “Memórias de Amor” integrou o documentário “Leva-me Contigo”. Como é que surgiu e como é que lidaste com o convite para vestires um documentário? Foi algo que
sempre ambicionaste fazer na música, isto de veres e ouvires o teu som em harmonia com a
arte cinematográfica?


R: Uma simbiose é sempre estimulante. Para mim o cinema também acaba por ser uma
referência de trabalho e abordagem artistica, a arte visual tem um bom magnetismo.
Quando era miúdo estava a passar canais e fui parar à RTP2 onde estava a dar o “Vale
Abraão” do nosso já falecido Manoel de Oliveira, cativado num instante. Mesmo puto, sem
perceber bem a dinâmica do filme, a imagética tinha uma linguagem sólida.
Quando surgiu o convite para musicar o documentário foi uma honra poder participar
ativamente nesta fusão artistica que o Afonso sonhou.


5 – O teu EP “Retratos” é uma espécie de fronteira, entre aquele que é o teu passado, aquele
que é o teu presente e aquilo que ambicionas para o teu o teu futuro. Ou seja, se
anteriormente te ouvimos em registos mais acústicos, com o “Retratos” podemos ouvir-te em registos mais rock e “ruidosos”. Além deste ponto de viragem, existe um outro, o de te fazeres acompanhar por uma banda. Quando é que sentiste que devias e tinhas de fazer esta transição na tua carreira?


R: Olha Rui, eu vou-te ser muito franco. A transição estava em mim, estava numa fase da
minha vida em que esse registo fazia sentido e tinha de encaixar… Um bocado como um
processo inverso de Beatles – experimentar primeiro pelo isolamento e depois desconstruir,
aproveitar outro espectro referencial.


6 – Quais são as principais diferenças que encontras entre o musicares e construíres um tema a solo e o de fazeres em conjunto com uma banda? Isto é, quais são as dicotomias no processo criativo?


R: O processo acaba por ser semelhante. Trabalho com músicos em quem confio e vamo-nos
desafiando conjuntamente. Acho que a maior diferença passa pela gestão do tempo, marcar
ensaios, gerir e compatibilizar horários…


7 – As tuas influências e referências são mutáveis consoante o tipo de som que estás a
explorar? Por outras palavras, que referências e inspirações tinhas nos teus trabalhos mais
acústicos e, por outro lado, que influências segues neste momento?


R: Acho que já respondi à pergunta do referencial mas posso dar mais umas luzes. Estás a ver
o Tim Maia? Para mim é importante estar-se entre Pernambuco e a Varsóvia. Com isto quero
dizer que é bom baralhar as temperaturas. Quase um chamariz para o público com “agora
pensa…”. No fundo, é seguro afirmar que a provocação é a minha maior influência.


8 – Esta é uma questão mais técnica. É a parte em que os teus instrumentos recebem os
holofotes que tanto merecem. Ou seja, é um convite à apresentação dos instrumentos e do
material mais usado por ti. Os pedais são muitos… Se não existirem segredos tão misteriosos como o da receita da poncha, sente-te à vontade para dar a conhecer o teu arsenal de instrumentos. (Podes e deves frisar marcas e modelos. Se é para catalogar é para catalogar).


R: A minha marca favorita desde miúdo é a Fender, sem dúvida. Confio muito na Fender,
sobretudo numa versão rara mexicana, a edição limitada Fender Del Castillo, é muito fixe!


9 – O “Amanhã” é uma canção que brota da vicissitude da pandemia. Posso-te assumir, aqui,
que este tema foi das melhores coisas que a pandemia trouxe aos meus ouvidos. Como é que enfrentaste o pico pandémico? Ajudou-te a estruturar ideias para o futuro? Ou simplesmente, interrompeu-te e condicionou o teu projeto?


R: É evidente que condicionou toda a cultura, aliás, o setor ainda está a sofrer as
consequências. Foi um confinamento variado, na fase mais relaxada deu para convívios
ligeiros e privados com os meus amigos mais próximos (sempre testados e / ou com
vacinação completa), o pior é quando apertava de restrições, a solidão nem sempre é a
melhor companheira de uma criação artistica, sobretudo quando o contexto é preocupante.
A saúde é um bem valioso, houve coisas que tiveram de ficar em pausa pelo bem público.


10 – A origem deste teu projeto, “Caio”, emerge devido a uma antiga banda tua. A música
“Planeta Caio”, composta por ti, foi a responsável do teu batismo. Tiveste outros nomes em
mente ou esteve, desde sempre, definido que serias o “Caio” que hoje conhecemos?


R: Quando o teu nome é João Santos fica difcil assumir-lhe um caráter de nome artistio
sonante (risos). Honestamente já nem me lembro que outras hipóteses houve em cima da
mesa mas Caio ganhou e estou satisfeito com essa vitória.


11 – Quanto ao futuro, o que nos podes revelar sobre ele? Ainda há bem pouco tempo, foi
divulgado e lançado o “Faltamos às Eleições”, tema este, escrito pelo Valter Lobo. É um
aperitivo do álbum que está em curso?


R: É sim. Para já ainda não posso revelar muito mas estou ansioso por puxar mais um pouco
ao véu do que reserva o Futuro…


12 – Caio, o que dizem os teus olh… * Para terminar, o que é que achas que deve ser feito, em Portugal, para que os artistas portugueses conquistem o espaço que merecem para, dessa forma, obterem o reconhecimento do país?


R: Não sei se a falha está nos artistas… Aliás, o que é imperativo para o desenvolvimento
cultural é o apoio público e o associativismo, já desde antes da pandemia eram os meios
mais dinâmicos e ainda há falhas a colmatar. Estamos num ponto de viragem mas a
divulgação assume tantos caráteres que é difcil perceber de onde vem a informação, o
crucial é que venha correta e que se lhe dê incentivo. Acho que este aspeto é transversal a
todas as artes e há urgência no setor.


13 – Esta questão não é uma questão. É um espaço em que, se quiseres, podes falar sobre algo que não me tenha ocorrido perguntar. Por isso, escreve sobre o que quiseres, como se
estivesses no Grupo III, da ficha de avaliação de Português.


R: Tenho a agradecer-te a entrevista, fiz o máximo para que se assemelha-se a uma boa
conversa domingueira. Às vezes julgo que falar do meu trabalho acaba por ser redundante
quando o meu trabalho não é falar mas hoje dei corda ao teclado e foram-me saindo estes
blocos a negrito. Olha, espero que esteja dentro do pretendido, um abraço!


Muito obrigado, Caio!

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